Em todas as campanhas eleitorais para a Presidência da República surgem candidatos com propostas mirabolantes para transformar o Brasil no país que todos queremos: uma nação desenvolvida, economicamente forte e socialmente justa. Essa missão não é fácil, mas também não é impossível.
Qualquer programa de governo sério, mais do que propostas bem emolduradas para convencer os eleitores por meio do horário eleitoral gratuito precisa ser resultado de profunda análise crítica das causas que levaram o país a atingir seu estado atual.
O Brasil perdeu o rumo. Admitir essa realidade deve ser o primeiro passo para enfrentar a crise prolongada e encontrar soluções definitivas. Os números mostram como o “país do futuro” se desnorteou no passado recente e no presente. Durante 30 anos – entre 1956 e 1961 e entre 1964 a 1988 – o Brasil cresceu à taxa média de 6,39% ao ano. Nos últimos 33 anos (de 1989 a 2021) o crescimento médio despencou a 2,05% ao ano, nível que corresponde a menos de um terço do patamar inferior. O que aconteceu?
Muitos dirão de forma apaixonada e sem amparo estatístico factual que dois fatores foram preponderantes para tal situação: o crescimento vertiginoso da população (de 81 milhões em 1964 para 213 milhões hoje) e a falta de recursos orçamentários dos governos. Tais argumentos, porém, não se sustentam.
A realidade é que jamais faltaram recursos. No período em questão, enquanto a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) caiu para 2,05% ao ano, a carga tributária nacional cresceu 41%, saltando de 22,43% para 31,64% do PIB.
Outros creditarão a queda do PIB à priorização de medidas sociais dos governos voltados para os cidadãos. Novamente, um erro. De acordo com o ranking da Organizações das Nações Unidas (ONU) que mede a qualidade de vida da população, nas três primeiras décadas citadas o Brasil subiu da 76ª para a 71ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Depois disso, afundou e hoje ocupa apenas a 84ª posição no ranking. O brasileiro, desassistido em suas necessidades básicas e cada vez mais pobre, sente na pele a queda na qualidade de vida. O coeficiente Gini, que também mede concentração e distribuição de renda, indica que o Brasil piorou muito: entre mais de 160 países, ocupa a 8ª pior posição. Uma vergonha internacional.
Se não houve falta de recursos e tampouco melhorias sociais significativas e duradouras, é preciso refletir como o país chegou a esse ponto. Em 33 anos, o PIB cresceu 4,48 vezes. Era de US$ 330,4 bilhões em 1988 e chegou a estimados US$ 1,48 trilhões em 2021. Se tivesse mantido a taxa média das três primeiras décadas analisadas, de 6,39% ao ano, o PIB brasileiro seria hoje de US$ 2,55 trilhões, ou seja, 72% maior. O suficiente para que o Brasil passasse a se posicionar como a 7ª economia do mundo, em vez da 12ª colocação atual.
É verdade que a população cresceu muito, mas essa não é a principal causa da situação de hoje. Há fatores muito mais importantes, verificados a partir de 1988. Um exemplo é a criação de 1.379 novos municípios desde então – aumento de um terço – a maioria deles com menos de 8.000 habitantes, sem viabilidade econômica e altas despesas com a remuneração de prefeito, vice-prefeito, secretários, vereadores e funcionalismo público. Outro exemplo é a criação de três novos estados – Roraima, Amapá e Tocantins -, com custosa estrutura administrativa dela decorrente, além de tribunais, autarquias etc. A máquina pública inchou absurdamente e hoje consome de 13,4% a 13,7% do PIB, o correspondente a 42% de todos os tributos arrecadados no Brasil.
Soma-se a isso verdadeira farra fiscal por meio de concessões de benefícios, renúncias, isenções e outros gastos tributários, descumprindo a Constituição e consumindo cerca de R$ 320 bilhões por ano, ou 4% do PIB. O quadro piora quando se computa o custo da corrupção para o País, estimado entre 1,35% e 2,35% do PIB, uma lesão aos cofres públicos que soma de R$ 108 bilhões a R$ 188 bilhões/ano. O custo total da corrupção mais o gigantismo da máquina pública e a generosidade das concessões fiscais chega a assustadores R$ 716 bilhões/ano, uma fortuna.
Há solução? Sim, se houver mais seriedade no trato da coisa pública e se for construído um sólido pacto nacional envolvendo sociedade, classe política, mídia, Judiciário e a elite intelectual. É urgente limitar os gastos tributários a 1,5% do PIB, no máximo, e reduzir a máquina pública – menos cargos em todos os níveis e, principalmente, de comissionados, permitindo reajustes salariais dos servidores e serviços públicos de maior qualidade.
A situação exige a adoção de outras medidas drásticas para acabar com privilégios, restringir o foro privilegiado apenas aos chefes dos três poderes, e rever o sistema tributário. Para assegurar punições efetivas e pôr fim à sensação geral de impunidade, são necessárias alterações legislativas para tornar imprescritíveis os crimes de corrupção e improbidade administrativa e possibilitar a prisão após condenação em segunda instância.
Além disso, o sistema eleitoral também precisa ser revisto, com o fim do instituto da reeleição e a redução significativa dos fundos partidário e eleitoral, que sangram os cofres públicos, e do número de partidos políticos, cuja maioria existe apenas para ter acesso aos recursos públicos. Seria salutar também discutir a coincidência de mandatos, eliminando-se os custos das eleições “solteiras”.
Outra medida necessária é reduzir, de forma expressiva, as decisões monocráticas dos tribunais superiores, garantindo maior segurança jurídica.
Alguns dos mais graves problemas do país, como se vê, não são insolúveis. Recolocar o Brasil no rumo do desenvolvimento é possível, porém exige medidas firmes, coragem, espírito público e o engajamento de toda a sociedade, a maior prejudicada com o grave quadro nacional.